Direito à saúde na Constituição Federal: princípios, SUS, iniciativa privada e muito mais

Olá megeanos(as)! 

No post hoje trataremos sobre um tema de suma importância e recorrente em concursos públicos, as bancas adoram utilizá-lo em provas. Portanto, estudaremos sobre o Direito à saúde na CF e seus princípios aplicáveis. Bem como também trabalharemos sobre o custeio do SUS sob a ótica da Constituição, a relação da assistência à saúde e a iniciativa privada, incluindo as modalidades de assistências: suplementar e complementar à saúde, além de trazer as atribuições do SUS e breves considerações sobre a Lei 8.080/90.

Este assunto foi retirado do ponto 6 de estudos do Clube do MP – Plano: Avançado.

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Clube do MP 2023

 

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1. DISPOSIÇÕES GERAIS

Por sua íntima ligação com o direito à vida e com a dignidade da pessoa humana, o direito à saúde possui um caráter de fundamentalidade que o inclui, não apenas dentre os direitos fundamentais sociais (art. 6º, CF), mas também no grupo de direitos que compõem o mínimo existencial. Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Ensina Marcelo Novelino que esse dispositivo, ao consagrar a saúde como direito de todos e dever do Estado, “está consubstanciado em uma norma de natureza principiológica, que estabelece fins a serem buscados pelo Estado”. Solidariedade entre os entes: Por sua vinculação direta à dignidade da pessoa humana, o direito à saúde é titularizado por todas as pessoas que estejam no território brasileiro, independentemente da nacionalidade e do país de domicílio (art. 5º, CF). Já o principal destinatário do dever é o Estado – gênero – sendo todos os entes federativos solidariamente responsáveis (art. 23, II, CF).

ATENÇÃO: diante da responsabilidade solidária entre os entes federativos pela efetivação do direito à saúde, em havendo a necessidade de provocação do Poder Judiciário para se valer de algum direito a esse respeito, o jurisdicionado poderá demandar a qualquer dos entes – União, Estado ou Município, sem que haja a necessidade de formação de litisconsórcio entre estes. Ressalte-se, ademais, que de acordo com a jurisprudência, o Ministério Público é parte legítima para figurar no polo ativo de ações que busquem à proteção do direito individual à vida e à saúde – porquanto, em última análise, tratam-se de direitos indisponíveis (Nesse sentido: STF, AI 734.487 AgR e RE 436.996 AgR).

De acordo com o STF: “Direito à saúde. Tratamento médico. Responsabilidade solidária dos entes federados. Repercussão geral reconhecida. Reafirmação de jurisprudência. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente” [, rel. min. Luiz Fux, j. 5-3-2015, P, DJE de 16-3-2015, Tema 793]

E, ainda: “Consolidou-se a jurisprudência desta Corte no sentido de que, embora o art. 196 da Constituição de 1988 traga norma de caráter programático, o Município não pode furtar-se do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde por todos os cidadãos. Se uma pessoa necessita, para garantir o seu direito à saúde, de tratamento médico adequado, é dever solidário da União, do Estado e do Município providenciá-lo” [, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 26-6-2012, 2ª T, DJE de 16-8- 2012].

Vale ressaltar que, no entanto, isso não exclui a responsabilidade da família e da sociedade nesta área, cujos papéis são extremamente relevantes para conferir maior efetividade a esse direito fundamental. Prevenção e reparação: O art. 196 da CF/88 impõe aos poderes públicos a adoção de políticas sociais e econômicas de caráter preventivo (p.ex., redução do risco de doença e de outros
agravos) e reparativo.

“A garantia do acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, enquanto concretização do princípio da isonomia, impõe aos poderes públicos o dever de agir fornecendo a todos prestações materiais e jurídicas adequadas a promoção e proteção da saúde, bem como sua recuperação nos casos de doença independentemente da situação econômica do indivíduo” [STF, RE(AgR) 271.286/RS].

Das ações e serviços públicos de saúde: Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. As prestações de serviços de saúde, apesar de abertas à iniciativa privada, estão submetidas ao controle do Estado, a quem foi atribuído, também, o dever de regulamentar as ações e serviços nesta área, e fiscalizar o cumprimento das normas que dispõem sobre o tema. Aprofundaremos o tema adiante, quando do estudo da legislação infraconstitucional.

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III – participação da comunidade.

Essas diretrizes (ou princípios) são reafirmadas pela lei nº 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde), em seu art. 7º. Vale ressaltar que o tema tem grande incidência nos concursos.

 

2. PRINCIPAIS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À SAÚDE

Alguns autores os dividem em:

  1. princípios doutrinários (universalidade, equidade e integralidade); e
  2. princípios organizativos (todos os outros do art. 7º, da Lei 8.080/90):

Art. 7º. As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as
diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:

I – universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;

II – integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;

III – preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral;

IV – igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;

V – direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;

VI – divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário;

VII – utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática;

VIII – participação da comunidade;

IX – descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:

a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;

b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;

X – integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;

XI – conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

XII – capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e

XIII – organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos.

XIV – organização de atendimento público específico e especializado para mulheres e vítimas de violência doméstica em geral, que garanta, entre outros, atendimento, acompanhamento psicológico e cirurgias plásticas reparadoras, em conformidade com a Lei nº 12.845, de 1º de agosto de 2013.

 

a) Universalidade:

É o acesso para todos os cidadãos. Trata-se de um princípio finalístico, ou seja, um ideal a ser alcançado, indicando uma das características do sistema que se pretende construir. Para que o SUS seja universal, necessário desencadear o processo de extensão de cobertura de serviços, de modo que venham, gradativamente, a se tornar acessíveis a toda a população.

Para tanto, é necessário eliminar barreiras jurídicas, econômicas, culturais e sociais que existem entre a população e os serviços. Importante saber, conforme já mencionamos anteriormente, que a CF/88 eliminou a primeira barreira ao universalizar o direito à saúde, que antes era ofertado apenas ao trabalhador ou “indigente”, características condicionantes de acesso aos serviços públicos antes do SUS.

 

b) Integralidade:

Diz respeito ao leque de ações possíveis para a promoção da saúde, prevenção de riscos e agravos e assistência a doentes, implicando a sistematização do conjunto de práticas que vêm sendo desenvolvidas para o enfrentamento dos problemas e o atendimento das necessidades de saúde. É, assim, um atributo do modelo de atenção, entendendo-se como tal um “modelo de atenção integral à saúde”, que dispõe de estabelecimentos, unidades de prestação de serviços, pessoal capacitado e recursos necessários à produção de ações de saúde, que vão desde as ações específicas em grupos populacionais definidos, ações de vigilância ambiental, sanitária e epidemiológica dirigidas ao controle de riscos e danos, até ações de assistência e recuperação de pessoas enfermas (diagnóstico, tratamento e reabilitação).

Ainda no que se refere a esse princípio, não se deve perder de vista que a Constituição dá prioridade para as atividades preventivas (sem prejuízo dos serviços assistenciais).

 

c) Descentralização:

Implica na transferência de poder de decisão sobre a política de saúde da esfera federal (Ministério da Saúde) para os Estados e Municípios (Secretarias de Saúde) – em especial, para os Municípios (vide art. 30, VII, CF).

A estrutura conferida ao SUS, com a descentralização das ações e a cooperação técnica e financeira dos entes federativos, reflete o federalismo cooperativo adotado pela CF/88. A regionalização e a hierarquização dos serviços dizem respeito à forma de organização dos estabelecimentos, entre si e com a população usuária do serviço.

  • Regionalização: 

Constitui estratégia prioritária para garantir o direito à saúde, reduzir desigualdades sociais e territoriais, promover a equidade e a integralidade da atenção, racionalizar os gastos, otimizar os recursos e
potencializar o processo de descentralização. A regionalização, assim, oferece os meios para melhorar a coordenação e integração do cuidado em saúde e seus custos, proporciona escala mais adequada e maior participação dos cidadãos no processo de tomada de decisão. É prevista e explorada em toda a normativa referente ao direito à saúde.

Objetivos da regionalização:

1. Garantir acesso, resolutividade e qualidade às ações e serviços de saúde cuja complexidade e contingente populacional transcendam a escala local/municipal;

2. Garantir o direito à saúde, reduzir desigualdades sociais e territoriais e promover a equidade;

3. Garantir a integralidade na atenção à saúde por meio da organização de redes de atenção à saúde integradas;

4. Potencializar o processo de descentralização, fortalecendo estados e municípios para exercerem papel de gestores e organizando as demandas nas diferentes regiões;

5. Racionalizar os gastos e otimizar os recursos, possibilitando ganhos em escala nas ações e serviços de saúde de abrangência regional.

  • Hierarquização:

Diz respeito à possibilidade de organização das unidades segundo o grau de complexidade tecnológica dos serviços, ou seja, o estabelecimento de uma rede que articula as unidades mais simples às mais complexas, mediante um sistema de referência (SR) e contrarreferência (CR) de usuários e informações.

 

d) Gratuidade:

Todo e qualquer tratamento realizado por médico, clínica ou hospital, conveniado ao SUS deve ser feito de forma totalmente gratuita para o cidadão, sendo vedada a cobrança a qualquer título por qualquer pessoa.

Registre-se que o código de ética médica prevê expressamente em seu art. 65 que é vedado ao médico “cobrar honorários de paciente assistido em instituição que se destina à prestação de serviços públicos, ou receber remuneração de paciente como complemento de salário ou de honorários”.

Nesse sentido, o STF reconheceu em sede de repercussão geral que “é constitucional a regra que veda, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, a internação em acomodações superiores, bem como o atendimento diferenciado por médico do próprio SUS, ou por médico conveniado, mediante o pagamento da diferença dos valores correspondentes. O procedimento da “diferença de classes”, tal qual o atendimento médico diferenciado, quando praticados no âmbito da rede pública, não apenas subverte a lógica que rege o sistema de seguridade social brasileiro, como também afronta o acesso equânime e universal às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde, violando, ainda, os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

Inteligência dos arts. 1º, inciso III; 5º, inciso I; e, 196 da Constituição Federal. Não fere o direito à saúde, tampouco a autonomia profissional do médico, o normativo que veda, no âmbito do SUS, a assistência diferenciada mediante pagamento ou que impõe necessidade de triagem dos pacientes em postos de saúde previamente à internação” [, rel. min. Dias Toffoli, j. 3-12-2015, P, DJE de 8-4-2016, tema 579].

Registre-se que a gratuidade engloba não apenas o atendimento e os tratamentos em clínicas e hospitais, mas também o fornecimento de medicamentos e de todo o aparato necessário ao tratamento do enfermo.

Contudo, a jurisprudência vem, há muito, alargando a possibilidade de fornecimento de medicamentos pelo Poder Público, considerando-o devido ainda que não constante de protocolo e listas do SUS, diante da ponderação do direito à saúde com os demais princípios constitucionais que lhe são contrapostos, ante a demonstração da indispensabilidade do medicamento para a manutenção da vida e saúde do paciente.

Contudo, o STF definiu a seguinte tese de repercussão geral:

“1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais.

2. A ausência de registro na Anvisa impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial.

3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos:

(I) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);

(II) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e

(III) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão necessariamente ser propostas em face da União. (Relator atual Min. Marco Aurélio Processo RE 657.718 Data do julgamento 22/5/2019).” 

 

3. CUSTEIO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Conforme o art. 198 da Constituição Federal:

CF, Art. 198, § 1º O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. (Parágrafo único renumerado para § 1º pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000).

§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000)

O custeio do SUS é feito com os recursos provenientes dos orçamentos dos entes federados, oriundos das contribuições sociais da seguridade social, previstas no art. 195, CF.

Com o intuito de conferir maior efetividade às ações e serviços públicos de saúde, a EC 29/00 acrescentou os parágrafos 2º e 3º ao art. 198 da CF (posteriormente alterados pela EC 86/15), estabelecendo a obrigatoriedade de aplicação de recursos mínimos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, a serem definidos por lei complementar.

A LC 141/2012 (que será analisada à frente) regulamenta o parágrafo 3º, para dispor sobre tais valores mínimos, a serem aplicados anualmente pelos entes em ações e serviços públicos de saúde.

 

4. ASSISTÊNCIA À SAÚDE E INICIATIVA PRIVADA

Considerando a relevância pública das ações e serviços de saúde, direito de todos e dever do Estado, a CF/88 atribuiu sua regulamentação, fiscalização e controle ao Poder Público, mas facultou a assistência à saúde a iniciativa privada. Todavia, esta não pode ser compelida a prestar assistência sem que haja a devida contraprestação (STF, RE 202.700/DF).

A participação de instituições privadas no SUS é instrumentalizada por meio de contratos de direito público ou convênios, firmados preferencialmente com entidades filantrópicas e sem finalidade lucrativa. Não há, portanto, impedimento de participação de instituições privadas com fins lucrativos – apesar de ser vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções a estas instituições.

Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.

§ 1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.

§ 2º É vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos.

§ 3º – É vedada a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saúde no País, salvo nos casos previstos em lei.

§ 4º A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização.

Remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas (art. 199, §4º):

A Lei nº 9.434/97 dispõe sobre “a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências”. São 23 apenas artigos, os quais recomendamos a leitura.

Sobre o assunto, interessante trecho da decisão do STF, na ADPF 54:

“Ao contrário do que sustentado por alguns, não é dado invocar, em prol da proteção dos fetos anencéfalos, a possibilidade de doação de seus órgãos[60]. E não se pode fazê-lo por duas razões. A primeira por ser vedado obrigar a manutenção de uma gravidez tão somente para viabilizar a doação de órgãos, sob pena de coisificar a mulher e ferir, a mais não poder, a sua dignidade. A segunda por revelar-se praticamente impossível o aproveitamento dos órgãos de um feto anencéfalo.

Essa última razão reforça a anterior, porquanto, se é inumano e impensável tratar a mulher como mero instrumento para atender a certa finalidade, avulta-se ainda mais grave se a chance de êxito for praticamente nula. (…) A mulher, portanto, deve ser tratada como um fim em si mesma, e não, sob uma perspectiva utilitarista, como instrumento para geração de órgãos e posterior doação. Ainda que os órgãos de anencéfalos fossem necessários para salvar vidas alheias – premissa que não se confirma, como se verá –, não se poderia compeli-la, com fundamento na solidariedade, a levar adiante a gestação, impondo-lhe sofrimentos de toda ordem.

Caso contrário, ela estaria sendo vista como simples objeto, em violação à condição de humana. (…) A solidariedade não pode, assim, ser utilizada para fundamentar a manutenção compulsória da gravidez de feto anencéfalo, seja porque violaria o princípio da dignidade da pessoa humana, seja porque os órgãos dos anencéfalos nãosão passíveis de doação” [, voto do rel. min. Marco Aurélio, j. 12-4-2012, P, DJE de 30- 4-2013].

5. ASSISTÊNCIA SUPLEMENTAR X ASSISTÊNCIA COMPLEMENTAR À SAÚDE

A CF/88 permite que a iniciativa privada explore economicamente o setor de saúde sob duas modalidades: suplementar e complementar.

 

a) Assistência suplementar:

A primeira coisa que é preciso saber a respeito disso é que essa modalidade NÃO faz parte do SUS.

A saúde suplementar consiste na atuação da iniciativa privada na área da saúde por meio, principalmente, da oferta de planos e seguros privados de assistência à saúde. A atuação da iniciativa privada nesse setor – que foi estimulada pela lógica privatista da previdência social – passa a ser regulamentada e fiscalizada após o novo tratamento dado pelo texto constitucional de 1988 à saúde.

Diante da necessidade de regulamentação e fiscalização, e a fim de resguardar o interesse público, foi editada a Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, e a Lei nº 9.961/00, que cria a ANS.

De acordo com a Lei 8.080/90:

Art. 20. Os serviços privados de assistência à saúde caracterizam-se pela atuação, por iniciativa própria, de profissionais liberais, legalmente habilitados, e de pessoas jurídicas de direito privado na promoção, proteção e recuperação da saúde.

Art. 21. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.

Art. 22. Na prestação de serviços privados de assistência à saúde, serão observados os princípios éticos e as normas expedidas pelo órgão de direção do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto às condições para seu funcionamento.

 

b) Assistência complementar:

Diferentemente da anterior, a assistência complementar faz parte do SUS e, como o próprio nome já esclarece, é por meio desta que o setor privado está autorizado a complementar as ações e serviços de saúde que fazem parte do SUS.

Como diz a Lei 8.080/90:

Art. 4º, § 2º A iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de Saúde (SUS), em caráter complementar.

Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.

Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.

Art. 25. Na hipótese do artigo anterior, as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos terão preferência para participar do Sistema Único de Saúde (SUS)

A participação da iniciativa privada no SUS (complementar), dá-se com o escopo de cumprir o princípio da universalidade. Destaca-se que a sua atuação se volta, principalmente, para a assistência de média e alta complexidade, que devem complementar a atenção básica para cumprir o atendimento integral (princípio da integralidade) previsto na Constituição.

6. ATRIBUIÇÕES DO SUS

A Constituição (no art. 200) traz um rol exemplificativo (numerus apertus) de competências do SUS, as quais foram ampliadas e regulamentadas pela lei 8.080/90 que, como já visto, “dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências”.

Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:

I – controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos;

II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador;

III – ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde;

IV – participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico;

V – incrementar, em sua área de atuação, o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 85, de 2015)

VI – fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano;

VII – participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos;

VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nelecompreendido o do trabalho.

7. BREVES CONSIDERAÇÕES DA LEI 8.080/90

Como mencionamos acima, ao avaliarem o conhecimento do candidato sobre o direito à saúde, as bancas de concurso tradicionalmente costumam cobrar o teor da Constituição Federal. Vez ou outra, porém, a Lei Orgânica da Saúde é objeto de questionamento – limitando-se, contudo, à letra da lei.

Art. 3o Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica do País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.

Parágrafo único. Dizem respeito também à saúde as ações que, por força do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à coletividade condições de bem-estar físico, mental e social.

O artigo traz um rol exemplificativo das determinantes e condicionantes da saúde. A Lei 12.864/13 inseriu, neste rol, a atividade física.

Sobre essa disposição legal, importante mencionar que de acordo com a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS), os determinantes sociais da saúde estão relacionados às condições em que uma pessoa vive e trabalha. Também podem ser considerados os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e fatores de risco à população, tais como moradia, alimentação, escolaridade, renda e emprego.

Os determinantes sociais não podem ser avaliados somente pelas doenças geradas, pois vão além, influenciando todas as dimensões do processo de saúde das populações, tanto do ponto de vista do indivíduo, quanto da coletividade na qual ele se insere. Por isso é importante que o setor de saúde se some aos demais setores da sociedade no combate às iniquidades – o que é chamado de intersetorialidade.

Todas as políticas que assegurem a redução das desigualdades sociais e que proporcionem melhores condições de mobilidade, trabalho e lazer são importantes nesse processo, além da própria conscientização do indivíduo sobre sua participação pessoal no processo de produção da saúde e de qualidade de vida.

 

Pois bem, megeanos(as)… Trouxemos aqui algumas temáticas que costumam aparecer com frequência em provas de concursos de TODAS AS CARREIRAS, sendo importantíssimo seu conhecimento sobre o tema.

Obrigado(a) pela atenção prestada.

Bons estudos e contem conosco!

 

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