Revisando #1: Inquérito Civil

Olá amigos!

Hoje trataremos de um assunto de crucial importância para os concursos do Ministério Público: o inquérito civil.

O inquérito civil, instrumento típico e exclusivo do parquet, foi disciplinado pelo Conselho Nacional do Ministério Público, por meio da Resolução Nº 23, de 17 de setembro de 2007, com o objetivo de padronizar a atuação ministerial em todos os Estados e na esfera federal, haja vista que não havia uniformidade procedimental nas Leis Orgânicas Estaduais que disciplinavam a atuação ministerial.

Via de regra cobrado nos concursos do Ministério Público no bloco de direitos difusos, esse peculiar instrumento constitucional recebeu, no ano de 2017, especial atenção das bancas examinadoras. Por exemplo, o tema foi abordado, de forma tangenciada, no MPRR (duas questões) e, de forma direta, no MPMG (uma questão), além do MPSP (cinco questões), sendo quatro de forma direta e uma indiretamente.

Percebam, portanto, que o assunto vem ganhando relevo e importância nos concursos ministeriais, apresentando forte tendência de cobrança sistemática, haja vista ser o instrumento maior de investigação ministerial no que toca aos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Imaginem uma prova para a carreira de Delegado de Polícia sem questões versando sobre o inquérito policial? Uma prova de Magistratura sem questões atinentes a sentença? Nesse sentido, caminha a importância do inquérito civil para os concursos do Ministério Público, com a peculiaridade que, do assunto, podem sair questões derivadas envolvendo assuntos como notícias de fato, procedimentos preparatórios, recomendações, compromisso de ajustamento de conduta, ação civil pública e os novos procedimentos administrativos, previstos na Resolução CNMP n° 174/17.

​Diante desse cenário, são naturais as dúvidas: o que é importante saber sobre o tema Inquérito Civil? Como estudar Inquérito Civil?

Para responder às indagações precisamos, rapidamente, abordar a Resolução CNMP n° 23/07, que nos traz a regulação do instrumento, analisando alguns pontos fundamentais e típicos de cobrança em primeira fase.

Dos requisitos para instauração, previstos no art. 1º, destaca-se a natureza unilateral e facultativa, a titularidade ministerial e a dispensabilidade de sua instauração.

Seu objeto, portanto, nas lições de Mazzili, é a coleta de elementos de convicção que sirvam de base à propositura de uma ação civil pública para a defesa de interesses transindividuais, tendo a natureza de procedimento administrativo e não de processo administrativo.

O art. 2º, por sua vez, dispõe sobre as formas de instauração do inquérito civil e seus requisitos, destacando-se a instauração de ofício, em face de requerimento ou representação, desde que com informações sobre o fato, seu provável autor e qualificação mínima, que permita sua identificação e localização e, por fim, a instauração por designação do Procurador-Geral de Justiça, do Conselho Superior do Ministério Público, Câmaras de Coordenação e Revisão e demais órgãos superiores da Instituição.

Ainda no art. 2º, destaca-se a possibilidade de manifestação anônima e de instauração de procedimento preparatório, com prazo de 90 dias, prorrogáveis, uma única vez, pelo mesmo prazo

Instauração

De igual importância, o art. 4º regulamenta a peça inaugural do inquérito civil, denominada de portaria. Dispõe mencionado artigo que o inquérito civil será instaurado por portaria, numerada em ordem crescente, renovada anualmente, devidamente registrada em livro próprio e autuada, contendo o fundamento legal que autoriza a ação do Ministério Público e a descrição do fato objeto do inquérito civil;  o nome e a qualificação possível da pessoa jurídica e/ou física a quem o fato é atribuído; o nome e a qualificação possível do autor da representação, se for o caso; a data e o local da instauração e a determinação de diligências iniciais; a designação do secretário, mediante termo de compromisso, quando couber; e  a determinação de afixação da portaria no local de costume, bem como a de remessa de cópia para publicação.

A simples leitura pode assustar, em razão do número de requisitos, mas percebam que existe uma lógica que pode ser associada a uma ação judicial para facilitar a memorização. Número, registro, fundamento legal, objeto definido, legitimidade (ativa e passiva) das partes interessadas, data, local, pedidos (diligências) e publicidade.

​Não nos custa lembrar que, dentre seus efeitos, desde a instauração até o encerramento do inquérito civil, obsta-se à decadência do direito que tem o consumidor de reclamar dos vícios aparentes ligados ao fornecimento de serviço ou produto (CDC, art. 26, § 2º, III) e que a instauração do inquérito civil permite que, em sua sede, se expeçam requisições e notificações, podendo ocorrer em seu bojo a conhecida condução coercitiva (CF, art. 129, VI; LONMP, art. 26, I; LOMPU, art. 8º).

Indeferimento

Em outro giro, o art. 5º discorre sobre o indeferimento de instauração do inquérito civil, estabelecendo a devida publicidade e o consequente contraditório para o representante, prevendo o recurso administrativo no prazo de 10 dias, com juízo de retração (efeito iterativo).

O art. 6º aborda a instrução do inquérito civil e possui algumas peculiaridades importantes, dentre as quais se destaca a formalidade dos atos de instrução e a possibilidade de expedição de precatórias. O §8º do art. 6º talvez seja o mais sensível da Resolução CNMP n° 23/06, vez que dispõe sobre a expedição de notificações, requisições, intimações ou outras correspondências expedidas pelo Ministério Público fazendo referência ao artigo 8°, § 4°, da Lei Complementar n° 75/93, no artigo 26, § 1°, da Lei n° 8.625/93 e, no que couber, no disposto na legislação estadual.

​Nesse ponto, aborda a necessária comunicação, pelo Procurador-Geral, a pessoas que exercem funções ou cargos especiais, cuja análise o candidato deverá, obrigatoriamente, analisar a Constituição Estadual e a Lei Orgânica Estadual do respectivo Ministério Público, para não correr o risco de se equivocar quanto a um possível vício formal.

A título de exemplo, vejamos o §4º, do art. 8º, da Lei Complementar Federal n° 75/93 e o art. 104. § 5º da Lei Complementar Estadual n° 734/93 do Estado de São Paulo:
LC 75. ART. 8º. § 4º – As correspondências, notificações, requisições e intimações do Ministério Público quando tiverem como destinatário o Presidente da República, o Vice Presidente da República, membro do Congresso Nacional, Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ministro de Estado, Ministro de Tribunal Superior, Ministro do Tribunal de Contas da União ou chefe de missão diplomática de caráter permanente serão encaminhadas e levadas a efeito pelo Procurador-Geral da República ou outro órgão do Ministério Público a quem essa atribuição seja delegada, cabendo às autoridades mencionadas fixar data hora e local em que puderem ser ouvidas, se for o caso.
LC 734. ART. 104. § 5º – As notificações e requisições previstas neste artigo, quando tiverem por destinatários o Governador do Estado, membros da Assembléia (sic) Legislativa, do Poder Judiciário de segunda instância e Secretários de Estado, serão encaminhadas pelo Procurador-Geral de Justiça. 
​Vejam, portanto, que a LC 734/93 traz destinatários diversos da Lei Federal, configurando-se, nesse aspecto, a autonomia ministerial para eleição dos destinatários especiais por meio de lei. Não se esqueçam, igualmente, que a própria Resolução n° 23/06 assegura aos Conselheiros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público referida prerrogativa.

O § 11, acrescido pela Resolução CNMP n° 161/17, trouxe uma novidade que certamente será objeto de cobrança, em que pese a divergência que paira sobre o mesmo. Dispõe referido parágrafo:
R 23. ART.. 6º. § 11. O defensor constituído nos autos poderá assistir o investigado durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do seu depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração, apresentar razões e quesitos. (acrescido pela Resolução 161/17).
Verifica-se, de tal sorte, que o CNMP expressamente consignou o contraditório parcial no curso do inquérito civil, constituindo, por meio de resolução, nulidade em peça meramente informativa. Como assinalado, ainda que passível de questionamentos, referido dispositivo passa a ser muito importante para questões de primeira fase, especialmente nos casos em que as assertivas trazem as expressões campeãs em derrubar os candidatos: nunca, sempre, em qualquer hipótese, em nenhuma hipótese… Assim, tenham bastante atenção com os enunciados!

Inquérito civil sigiloso

Acelerando um pouquinho, porque o objeto do presente texto é tão somente chamar a atenção para a importância do tema e abordar alguns aspectos do inquérito civil, sem pretensão de esgotá-lo, o art. 7º prevê a publicidade e a possiblidade de decretação de sigilo motivado, destacando que os documentos, resguardados por sigilo legal, deverão ser autuados apensos e que o defensor poderá, mesmo sem procuração, examinar autos de investigações findas ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade.

​Por sua vez, o art. 9º dispõe que o inquérito civil deverá ser concluído no prazo de um ano, prorrogável pelo mesmo prazo e quantas vezes forem necessárias, por decisão fundamentada de seu presidente, com ciência ao Conselho Superior do Ministério Público, à Câmara de Coordenação e Revisão ou à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão.

A peculiaridade nesse dispositivo recai sobre o parágrafo único, que assinala que cada Ministério Público, no âmbito de sua competência administrativa, poderá estabelecer prazo inferior, bem como limitar a prorrogação mediante ato administrativo do Órgão da Administração Superior competente.

Logo, cuidado com os enunciados novamente! Eles são a chave para pontuarem corretamente.

​Vejam a seguinte assertiva e respondam falso ou verdadeiro antes de lerem o comentário abaixo:

“O prazo legal para conclusão do inquérito civil é de um ano, prorrogável pelo mesmo período, por quantas vezes for necessário”

​Acharam que seria simples não é? Em regra, a assertiva é verdadeira, mas para o MPSP, por exemplo, a assertiva seria incorreta nos termos do Art. 24 do Ato nº 484/06:

O inquérito civil deverá ser concluído no prazo de 180 dias, prorrogável quando necessário, cabendo ao órgão de execução motivar a prorrogação nos próprios autos.

Logo, registra-se a importância do conhecimento da Lei Orgânica do Ministério Público de seu concurso alvo, para buscar essas pequenas regrinhas, que podem ser decisivas para aquele ponto que pode te levar a segunda etapa.

​Arquivamento

Finalizando essa breve abordagem sobre o inquérito civil, temos, no art. 10, o arquivamento dos procedimentos regulados pelo CNMP pela Resolução n° 23/06.

A Resolução traz o denominado controle de legalidade, dispondo que o arquivamento há de ser fundamentado.

​Contudo, pode ocorrer que o arquivamento não atenda à exigência legal, ou que não seja suficientemente fundamentado quando há vários atos ilícitos, em tese, e o promotor de justiça só aborda expressamente alguns dos atos na promoção de arquivamento ou, quando há vários possíveis autores ou responsáveis pelas ilegalidades, e o membro do parquet só analisa expressamente a responsabilidade ou a ausência de responsabilidade de alguns deles.

​Outrossim, pode ocorrer que o promotor de justiça não promova o arquivamento do inquérito civil e sim proponha a ação civil pública restringindo os limites objetivos ou subjetivos da lide, deixando de apresentar fundamentação no tocante a outros possíveis ilícitos ou seus autores, ou, ainda, se o faz, não destina suas ponderações ao órgão legalmente encarregado de rever sua decisão de arquivamento, que é o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP).

Nesses casos, estamos diante do irregular arquivamento implícito, vez que todo arquivamento deve ser expresso e fundamentado. Diante dessa irregularidade, o próprio membro pode, de ofício, corrigir o equívoco manifestando-se diretamente ao CSMP, ou mesmo referido órgão ser provocado por qualquer interessado ou magistrado, em analogia ao art. 28 do Código de Processo Penal (CPP), em cotejo com o art. 9º da Lei de Ação Civil Pública, lembrando que o fato será levado ao CSMP e não ao Procurador-Geral de Justiça, como no caso do art. 28 do CPP.

​Noutra linha, deixando o órgão de revisão competente de homologar a promoção de arquivamento, poderá converter o julgamento em diligência, para a realização de atos imprescindíveis à sua decisão após especificá-los, remetendo os autos ao promotor que se manifestou pelo arquivamento que, por sua vez, poderá recusar fundamentadamente o cumprimento da diligência, remetendo os autos ao PGJ para que designe outro membro para atuar nos autos.

​Pode, ainda, o órgão de revisão, deliberar pelo prosseguimento do inquérito civil ou do procedimento preparatório, indicando os fundamentos de fato e de direito de sua decisão, adotando as providências relativas à designação, em qualquer hipótese, de outro membro do Ministério Público para atuação.

Em linhas gerais, relembramos, sem pretensão de esgotar o assunto, esses são alguns dos pontos mais importantes do inquérito civil e devem ser dominados por todos os candidatos. Para tanto, a leitura e releitura com bastante atenção da Resolução CNMP n°23/06 é fundamental para que conheçam os detalhes e as peculiaridade da ferramenta administrativa extrajudicial mais importante a cargo do Ministério Público.

​Assim, esperamos que a breve abordagem temática realizada neste blog possa contribuir para que despertem o interesse por um assunto tão relevante para as provas de Ministério Público, especialmente pela alta incidência no ano de 2017, o que deve ser uma tônica também para os próximos certames.

Abaixo, segue o vídeo com as nossas questões antecipadas sobre este tema no concurso do MP-SP 187.

Forte Abraço, bons estudos e fiquem com Deus!

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