Olá megeanos(as)!
Neste blogpost, exploramos o conceito de recursos, sua classificação detalhada e os princípios que norteiam sua aplicação no Processo Civil . Aprofunde-se neste tema indispensável para concursos e prática jurídica e não erre mais nenhuma questão do tema!
Os recursos desempenham um papel essencial no direito processual civil, permitindo a revisão de decisões judiciais e garantindo a busca pela justiça no curso do processo. Com base em um conjunto de princípios e efeitos, eles oferecem às partes uma oportunidade de contestar decisões desfavoráveis, seja para reformá-las, anulá-las ou esclarecê-las.
1. CONCEITO
O recurso é uma espécie de meio de impugnação das decisões judiciais proferidas em um mesmo processo, com a finalidade de obter a invalidação, a reforma, o esclarecimento ou a integração delas. O conceito de recurso deve ser construído partindo-se de cinco características essenciais:
- Voluntariedade;
- Previsão expressa em lei federal;
- Desenvolvimento no próprio processo no qual a decisão impugnada foi proferida;
- Manejável pelas partes, terceiros prejudicados e Ministério Público;
- Possui como objetivo reformar, anular, integrar ou esclarecer decisão judicial.
Portanto, o recurso é um meio de impugnação da decisão judicial, voluntário, que se desenvolve no próprio processo em que a decisão foi proferida, previsto como tal em lei federal, interposto pelas partes, terceiro prejudicado ou Ministério Público, com o objetivo de reformar, anular, esclarecer ou integrar uma decisão.
2. CLASSIFICAÇÃO
A doutrina, tradicionalmente, adota quatro critérios de classificação dos recursos:
a) Objeto Imediato Tutelado Pelo Recurso
Ao adotarmos esse critério, os recursos são divididos em duas espécies:
- Recursos ordinários: possui como objeto a tutela do interesse das partes. Quando o legislador cria um recurso ordinário, está pensando nas partes, em fornecer a estas um mecanismo de defender os seus próprios interesses.
- Recursos extraordinários: busca a preservação do direito, e não propriamente os interesses das partes.
Contudo, é importante ressaltar que no nosso ordenamento jurídico não existe recurso subjetivo, ou seja, todos os nossos recursos são objetivos. Portanto, até nos recursos extraordinários teremos a tutela da parte, pois se a parte que recorreu extraordinariamente sagrar-se vencedora, terá tutelado o seu interesse.
Além disso, o cabimento de recurso extraordinário depende exaurimento dos recursos ordinários.
b) Fundamentação Recursal (Causa De Pedir Recursal)
Neste caso, temos o recurso de fundamentação livre e o recurso de fundamentação vinculada.
- Recurso de fundamentação livre: o recorrente pode alegar qualquer matéria. Lembrando que abstratamente o recorrente pode alegar qualquer matéria, mas, no caso concreto terá que restringir a impugnação ao objeto da demanda e respeitar as preclusões.
- Recurso de fundamentação vinculada: a parte só pode alegar matéria expressamente prevista em lei. Exemplos: Recurso Extraordinário, Recurso Especial e os embargos de declaração. No recurso de fundamentação vinculada, qualquer causa de pedir que extrapole o rol legal gera a inadmissão do recurso.
c) Abrangência da matéria Impugnada
- Recurso total: é o recurso que traz a impugnação de toda parte da decisão que gerou sucumbência. Para o recurso ser total, não é necessária a impugnação da totalidade da decisão, mas da parte relacionada à sucumbência.
- Recurso parcial: é o recurso que traz a impugnação de parte da decisão que gerou sucumbência.
Art. 1.002. A decisão pode ser impugnada no todo ou em parte. |
Quem escolhe se o recurso será total ou parcial é o recorrente. Sobre o tema, é importante ressaltar que o capítulo não impugnado fica acobertado pela preclusão. Assim, o tribunal, ao julgar o recurso parcial, não poderá adentrar o exame de qualquer aspecto relacionado ao capítulo não impugnado.
O § 1º do art. 1.013 do CPC, embora trate da apelação, é parâmetro interpretativo para os demais recursos:
§ 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.
No mesmo sentido, o parágrafo único do art. 1.034 que regula o efeito dos recursos extraordinários:
Parágrafo único. Admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial por um fundamento, devolve-se ao tribunal superior o conhecimento dos demais fundamentos para a solução do capítulo impugnado.
d) Independência ou Subordinação do Recurso
- Recurso principal/independente: é o recurso interposto no prazo recursal e independe da postura da parte contrária diante da decisão.
- Recurso subordinado: é o recurso interposto no prazo das contrarrazões e depende da postura adotada pela parte contrária diante da decisão. Em outras palavras, só existe porque a parte contrária recorreu, pois, se a parte contrária não tivesse recorrido, a decisão teria transitado em julgado. A subordinação revela-se na circunstância de que o conhecimento desse recurso depende do conhecimento do recurso interposto pela outra parte. Há duas espécies de recurso subordinado previstas no CPC: o recurso adesivo (art. 997, § 1º) e a apelação do vencedor contra decisão interlocutória (art. 1.009, § 1º).
Características do recurso adesivo (art. 997 do NCPC):
Art. 997. Cada parte interporá o recurso independentemente, no prazo e com observância das exigências legais.
§ 1º Sendo vencidos autor e réu, ao recurso interposto por qualquer deles poderá aderir o outro.
§ 2º O recurso adesivo fica subordinado ao recurso independente, sendo-lhe aplicáveis as mesmas regras deste quanto aos requisitos de admissibilidade e julgamento no tribunal, salvo disposição legal diversa, observado, ainda, o seguinte:
I – será dirigido ao órgão perante o qual o recurso independente fora interposto, no prazo de que a parte dispõe para responder;
II – será admissível na apelação, no recurso extraordinário e no recurso especial;
III – NÃO SERÁ CONHECIDO, se houver desistência do recurso principal ou se for ele considerado inadmissível.
O recurso adesivo é interposto no prazo das contrarrazões do recurso principal, e não é qualquer recurso que possibilita a existência de um recurso adesivo, mas apenas os recursos de apelação, extraordinário e o especial. Ademais, cabe frisar que o recurso adesivo não é uma nova espécie recursal, mas forma diferenciada de interposição dos três recursos que o possibilitam.
É importante ressaltar que só é possível a interposição de recurso adesivo no caso de sucumbência recíproca. Além disso, este só será julgado se o recurso principal for admitido, ou seja, só há uma chance de o tribunal julgar o recurso adesivo se o recurso principal for conhecido.
3. PRINCÍPIOS RECURSAIS
a) Duplo grau de jurisdição:
Refere-se à possibilidade de revisão da solução do processo, ou seja, a permissão para que a parte possa ter uma segunda opinião concernente à decisão da causa.
A doutrina majoritária entende que ao recurso extraordinário e especial não se aplica o princípio do duplo grau de jurisdição, tendo em vista que a devolução é limitada a apenas matéria de direito e são recursos de fundamentação vinculada, no qual o recorrente somente poderá alegar as matérias exaustivamente previstas em lei.
A doutrina diverge com relação à necessidade de julgamento por órgão jurisdicional hierarquicamente superior ao órgão prolator da decisão para que seja considerado aplicado o duplo grau de jurisdição. Parte da doutrina entende que não há essa necessidade, pugnando pela existência do duplo grau de jurisdição em casos como o recurso inominado previsto na Lei 9.099/1995.
Outra parcela da doutrina, entende ser imprescindível para a aplicação do referido princípio o julgamento do recurso por órgão jurisdicional hierarquicamente superior (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 2018 e DIDIER Jr., Fredie; Leonardo Carneiro. Curso de Direito Processual Civil v.3 – 18. ed, 2021).
b) Taxatividade:
Por este princípio, somente pode ser considerado recurso o instrumento de impugnação que estiver expressamente previsto em lei federal como tal.
O princípio da taxatividade impede que as partes, ainda que de comum acordo, criem recursos não previstos pelo ordenamento jurídico processual. Mesmo com a permissão do acordo procedimental previsto no art. 190 do Novo CPC, não é possível que o acordo tenha como objeto a criação de um recurso não previsto no rol legal. A doutrina também não pode criar novas espécies recursais.
ATENÇÃO! O conhecimento a respeito do tema foi cobrado pela FCC NO CONCURSO DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL DO ANO DE 2020, tendo a banca examinadora considerado incorreta a seguinte afirmativa: “O princípio da taxatividade recursal tem sido mitigado, admitindo-se a criação de recursos não previstos expressamente em lei, desde que as partes criem tais recursos de comum acordo, como negócio jurídico-processual”. |
c) Singularidade (unirrecorribilidade ou unicidade):
O princípio da singularidade admite somente uma espécie recursal como meio de impugnação de cada decisão judicial. Portanto, mesmo quando a sentença decidir várias questões, estas devem ser impugnadas por meio do recurso de apelação, não cabendo o recurso de agravo de instrumento.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça segue esse posicionamento, considerando a decisão judicial como um todo indivisível, sendo cabível apenas um recurso. Essa realidade vem consagrada no art. 1.009, § 3º, do Novo CPC, ao prever expressamente que, quando as questões mencionadas no art. 1.015 (decisões interlocutórias impugnáveis por agravo de instrumento) integrem a sentença, será cabível o recurso de apelação.
O princípio em análise possui algumas exceções consagradas pela própria legislação, como ocorre com a interposição conjunta do recurso extraordinário e especial (art. 1.031 do CPC); com a ação de mandado de segurança de competência originária de Tribunal de segundo grau parcialmente acolhido, em que contra o capítulo de provimento caberá recurso especial e/ou recurso extraordinário, enquanto do capítulo denegatório caberá recurso ordinário constitucional.
ATENÇÃO! O conhecimento a respeito do tema foi cobrado pela FCC NO CONCURSO DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL DO ANO DE 2020, tendo a banca examinadora considerado correta a seguinte afirmativa: “Pelo princípio da singularidade ou unirrecorribilidade afirma-se que só se admite uma espécie recursal como meio de impugnação de cada decisão judicial, mostrando-se defeso interpor sucessiva ou concomitantemente duas espécies recursais contra a mesma decisão”. |
d) Voluntariedade:
A existência do recurso é condicionada exclusivamente à vontade da parte, que demonstra a vontade de recorrer com o ato de interposição do recurso. Desse modo, não se admite que o juiz, em qualquer hipótese, interponha recurso de ofício, por isso que o instituto do reexame necessário é considerado um sucedâneo recursal, e não um recurso, em razão da falta de voluntariedade.
e) Dialeticidade:
Costuma-se afirmar que o recurso é composto por dois elementos: o volitivo (referente à vontade da parte em recorrer) e o descritivo (consubstanciado nos fundamentos e pedido constante no recurso). O princípio da dialeticidade diz respeito ao segundo elemento, exigindo do recorrente a exposição da fundamentação recursal, para fins de permitir ao recorrido a elaboração das contrarrazões e fixar os limites de atuação do Tribunal no julgamento do recurso.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça adota o princípio da dialeticidade, exigindo que a fundamentação recursal impugne especificamente os fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso.
Confira-se:
“Razões do agravo em recurso especial que não impugnaram especificamente os fundamentos da decisão proferida em juízo prévio de admissibilidade, violando o princípio da dialeticidade, o que autorizou o não conhecimento do reclamo, nos termos do art. 932, inc. III, do CPC/2015.” (STJ, AgInt no AREsp 2116718 / CE, Quarta Turma, Rel. Min. MARCO BUZZI, DJe 17/12/2022).
O NCPC no artigo 932, inciso III, consagra o referido princípio ao dispor que incumbe ao relator não conhecer de recurso que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida.
f) Fungibilidade:
O princípio da fungibilidade permite a conversão de um recurso em outro em caso de equívoco da parte, possibilitando, assim, o recebimento de um recurso incabível por outro cabível. Trata-se de notória flexibilização do pressuposto de admissibilidade recursal do cabimento. A fungibilidade se funda nos princípios da instrumentalidade das formas, da boa-fé processual e na primazia do julgamento do mérito, amparando-se na ideia de que o desvio da forma legal sem a geração do prejuízo não deve ocasionar a nulidade do ato processual.
Os requisitos para aplicação deste princípio são:
- Existência de dúvida objetiva: é aquela razoavelmente aceita a partir de elementos objetivos, como o equívoco no texto da lei ou divergências doutrinárias e jurisprudenciais sobre o tema;
- O equívoco não pode se tratar de erro grosseiro;
- Observância do prazo do recurso que deveria ter sido interposto.
O CPC trouxe duas hipóteses expressas de aplicação do princípio da fungibilidade recursal. O art. 1.024, § 3º, do Novo CPC permite o recebimento de embargos de declaração contra decisão monocrática em tribunal como agravo interno, exigindo do juízo a intimação prévia do recorrente para que, no prazo de cinco dias, complemente as razões recursais. Os arts. 1.032 e 1.033 do Novo CPC consagram a fungibilidade entre o recurso especial e o recurso extraordinário.
A jurisprudência dos tribunais superiores considera erro grosseiro a interposição de agravo em recurso extraordinário quando cabível agravo interno contra a decisão que nega seguimento ao recurso extraordinário observando a sistemática da repercussão geral ou ao recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do STJ em julgamento de recursos repetitivos, nos termos do §2º do art. 1.030 (STJ; ARE-RE-EDcl-AgInt-AREsp 939.065; Proc. 2016/0162047-1; RS; Corte Especial; Rel. Min. Jorge Mussi; DJE 18/12/2020 e HC 154737, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 29/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 15-07-2020 PUBLIC 16- 07-2020).
g) Proibição da reformatio in pejus:
Por este princípio não se admite que a situação do recorrente seja piorada em virtude do julgamento de seu próprio recurso, desde que a outra parte não tenha recorrido.
Ainda que não exista previsão expressa no ordenamento pátrio a esse respeito, a doutrina entende que não existe dúvida de que o direito processual civil brasileiro adotou o princípio da proibição da reformatio in pejus, de forma que na pior das hipóteses para o recorrente, a decisão recorrida é mantida, não podendo ser alterada para piorar sua situação.
A reformatio in pejus é excepcionalmente admitida na aplicação do efeito translativo dos recursos, por meio do qual se admite que o tribunal conheça originariamente matéria conhecível de ofício. Neste caso, o recorrente poderá ser prejudicado pelo seu próprio recurso, tendo em vista que o Tribunal poderá extinguir o processo sem resolução do mérito, em razão do reconhecimento de matéria de ordem pública.
O Superior Tribunal de Justiça entende não haver ofensa ao princípio ora analisado no caso da adoção de fundamentos diversos dos adotados pela decisão impugnada (STJ, 6a Turma, AgRg no RMS 28.147/MS, rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 19/03/2015, DJe 30/03/2015) ou quando houver alteração da natureza da responsabilidade civil (STJ, 2a Turma, AgRg no AREsp 369.691/RJ, rei. Min. Herman Benjamin, j. 18/03/2014, DJe 27/03/2014).
4. EFEITOS RECURSAIS:
a) Efeito obstativo:
O efeito obstativo está ligado à preclusão temporal e sua relação com a interposição do recurso. A doutrina majoritária entende que a interposição de qualquer recurso impede a geração da preclusão temporal, bem como do trânsito em julgado, que somente vai ocorrer após o julgamento do recurso.
b) Efeito devolutivo:
Trata-se da transferência ao órgão “ad quem” do conhecimento de matérias que já tenham sido objeto de decisão no juízo “a quo”.
A doutrina entende que todo recurso gera efeito devolutivo. Isso porque a incidência do efeito devolutivo independe de a competência para analisar o recurso ser de órgão distinto do recorrido. O essencial aqui é que seja permitida uma nova análise da matéria anteriormente decidida, pouco importando qual órgão jurisdicional fará tal exame. Classifica-se como efeito devolutivo impróprio aquele relacionado a recurso analisado pelo mesmo órgão julgador que prolatou a decisão, como ocorre no recurso de embargos de declaração, e efeito devolutivo próprio aquele relacionado ao recurso que será objeto de apreciação por órgão jurisdicional diferente do que prolatou a decisão, que é o que ocorre com a maioria dos recursos.
O efeito devolutivo deve ser examinado em duas dimensões: quanto à extensão (dimensão horizontal) e quanto à profundidade (dimensão vertical). A extensão do efeito devolutivo significa delimitar o que será submetido, por força da interposição do recurso, ao julgamento do órgão ad quem. É definir a exata medida em que a decisão será impugnada, podendo sê-la total ou parcialmente. Portanto, os capítulos da decisão que não forem objeto de impugnação no recurso não poderão ser objeto de apreciação pelo tribunal, pois estarão acobertados pelo manto da coisa julgada.
O efeito horizontal está previsto no art. 1.013, caput, do CPC:
Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
Nesse sentido, é também a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
A extensão do efeito devolutivo da apelação é definida pelo pedido do recorrente e qualquer julgamento fora desse limite não pode comprometer a efetividade do contraditório, ainda que se pretenda aplicar a teoria da causa madura (STJ. 4ª Turma. REsp 1.909.451-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/03/2021 – Info 690).
Já a dimensão vertical é entendida como a profundidade da devolução.
Dessa forma, dentro daquelas matérias definidas pelo recorrente, o tribunal poderá analisar todos os fundamentos, questões e alegações relativas àquela matéria, ainda que eles não tenham sido objeto de recurso pela parte:
§1º – Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.
§ 2º – Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos DEMAIS.
Dessa forma, apesar de o efeito devolutivo, em sua acepção horizontal, ser definido pela vontade do recorrente, em sua acepção vertical, o efeito devolutivo independe da vontade do recorrente, sendo devolvido ao tribunal a análise de todas as questões relativas ao capítulo impugnado.
c) Efeito suspensivo:
O efeito suspensivo diz respeito à impossibilidade de a decisão impugnada gerar efeitos enquanto não for julgado o recurso interposto.
Nem todo recurso tem efeito suspensivo previsto em lei, mas em todos é possível a sua obtenção no caso concreto, desde que preenchidos determinados requisitos. O efeito suspensivo previsto em lei é chamado de efeito suspensivo próprio, enquanto o efeito suspensivo obtido no caso concreto, a depender do preenchimento de determinados requisitos, é chamado de efeito suspensivo impróprio.
O CPC prevê que, salvo disposição expressa de lei, o recurso não possui efeito suspensivo:
Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso.
Ademais, o CPC também estabeleceu os requisitos para que o relator conceda efeito suspensivo no caso concreto. São eles:
a) risco de dano grave ou de difícil ou impossível reparação, gerado pela produção imediata de efeitos da decisão;
b) ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso
Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
Ainda que o parágrafo único do art. 995 tenha sido omisso a esse respeito, a doutrina entende que o pedido expresso do requerente continua a ser requisito para a concessão do efeito suspensivo.
Há recursos que possuem efeito suspensivo automático, por determinação legal. É o que ocorre com a apelação (art. 1012 do CPC) e o recurso especial ou extraordinário interposto contra decisão que julga incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 987, § 1º, CPC). É importante ressaltar que, com relação à apelação, o próprio legislador trouxe exceções ao efeito suspensivo automático contidas no § 1º do art. 1.012 do CPC, o que não obsta que a parte requeira nessas hipóteses a concessão do efeito suspensivo, nos termos dos §§ 3º e 4º do art. 1.012 do CPC.
d) Efeito translativo:
Por efeito translativo, entende-se pela possibilidade de o tribunal conhecer determinadas matérias de ofício no julgamento do recurso. Normalmente é associado às matérias de ordem pública, mas também se aplica às matérias que, apesar de não serem propriamente de ordem pública, a própria lei determina que podem ser conhecidas de ofício (ex.: prescrição).
No âmbito dos recursos ordinários, é pacífica na jurisprudência a possibilidade de o tribunal conhecer de ofício a matéria de ordem pública e a prescrição. A grande controvérsia diz respeito aos recursos excepcionais (recurso especial e extraordinário).
Uma primeira corrente entende que não é possível o reconhecimento de ofício das matérias de ordem pública em razão da ausência de prequestionamento de tal matéria, o que impediria sua análise pelos tribunais superiores. Esse, inclusive, é o entendimento do STF (AI 823.893-AgR/MG) e do STJ (AgRG no Resp 1.189.824/RS).
Uma segunda corrente entende que o prequestionamento é apenas um requisito especial de admissibilidade recursal, voltado à admissibilidade do recurso, e não ao seu mérito. Sendo assim, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso, haveria o conhecimento do recurso, com a consequente possibilidade de análise das matérias de ordem pública, mesmo que não prequestionadas.
e) Efeito expansivo:
Será gerado o efeito expansivo toda vez que o julgamento do recurso ensejar decisão mais abrangente do que a matéria impugnada, ou ainda quando atingir sujeitos que não participaram como partes no recurso, apesar de serem partes na demanda. Na primeira situação, ocorre o chamado efeito expansivo objetivo, o qual pode ser ainda interno ou externo, a depender da matéria atingida pelo julgamento do recurso estar localizada dentro ou fora da decisão impugnada. Na segunda situação, há o chamado efeito expansivo subjetivo.
f) efeito substitutivo:
O CPC determina que o julgamento do recurso substituirá a decisão recorrida, nos limites da impugnação:
Art. 1.008. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão impugnada no que tiver sido objeto de recurso.
A doutrina, contudo, defende que não se deve interpretar o dispositivo de forma literal, uma vez que a substituição por ele apregoada somente ocorre nos julgamentos de mérito recursal, e ainda assim, a depender do resultado de tal julgamento, não ocorrendo a substituição em caso de não conhecimento do recurso.
No caso de recurso julgado em seu mérito, é preciso analisar o conteúdo da decisão para saber se há ou não o efeito substitutivo. Sendo a causa de pedir do recurso fundada em “error in iudicando” e o pedido de reforma da decisão, qualquer que seja a decisão de mérito do recurso haverá a substituição da decisão recorrida. Já nos casos de causa de pedir composta por “error in procedendo” e sendo o pedido de anulação da decisão, somente haverá efeito substitutivo no caso de “não provimento” do recurso, porque o provimento do recurso, ao anular a decisão impugnada, não a substitui, uma vez que uma nova decisão deverá ser proferida em seu lugar.
g) Efeito regressivo:
Cuida-se de efeito que autoriza o órgão a quo a rever a decisão recorrida, a se retratar da sua decisão.
Este efeito se aplica aos recursos de: apelação contra sentença que indefere a petição inicial (art. 331, caput), apelação contra a sentença de improcedência liminar do pedido (art. 332, § 3º), apelação contra sentença que extingue o processo sem resolução do mérito (art. 485, § 7º), agravo de instrumento (art. 1018, § 1º), agravo interno (art. 1021, § 2º), agravo em recurso especial ou extraordinário (art. 1042, § 1º) e recursos especial e extraordinário repetitivos (art. 1040, II). Portanto, observa-se que todos os recursos de agravo possuem o efeito regressivo.
h) Efeito diferido:
Ocorre quando o conhecimento do recurso depende de recurso a ser interposto contra outra decisão ou a mesma decisão.
No primeiro caso, pode-se dar como exemplo a necessidade de a apelação ser conhecida para que a impugnação da decisão interlocutória não recorrível por agravo de instrumento seja julgada em seu mérito.
No segundo caso, ocorre, por exemplo, na hipótese do uso de recurso especial e do extraordinário contra o mesmo acórdão, sempre que a análise do segundo dependa do conhecimento e julgamento do primeiro. Também o recurso adesivo somente será julgado se o recurso principal for conhecido e julgado em seu mérito.
Então vimos aqui que os recursos são instrumentos fundamentais no direito processual civil, garantindo não apenas a revisão das decisões judiciais, mas também a aplicação efetiva de princípios como o duplo grau de jurisdição, a voluntariedade e a dialeticidade. Compreender suas classificações, efeitos e fundamentos é essencial para a correta aplicação prática e para o sucesso em concursos jurídicos. Dominar esse tema é estar preparado para enfrentar questões complexas com segurança e precisão.
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