Prezadas amigas e amigos, o dia 09.03.21 foi marcado pela aprovação do PL 1.369/19, que previa a tipificação da conduta conhecida por stalking.
O texto foi aprovado pelo senado e seguiu para a sanção do Presidente da República, de forma que o presente texto, desenvolvido para o meu livro de Direito Penal – Parte Especial – ainda em desenvolvimento, depende da sanção presidencial para validação. Havendo vetos, alterarei o texto para vocês.
Naturalmente, há temas que podem ser controversos na doutrina, como, por exemplo, a natureza formal do delito por mim sustentada, entre outros pontos. De qualquer forma, fiquem a vontade para, no nosso Instagram e canal de comunicação do Curso Mege, buscarem esclarecimentos e apresentarem críticas.
Este conteúdo é parte do trabalho de constante atualização dos materiais para nossos alunos e, antes de ser enviado para vocês, foi enviado para as Turmas Ponto a Ponto MP/MG, MP/SP e Clube do MP.
Forte abraço e fiquem com Deus!
Lista de tópicos
Perseguição
Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Pena – reclusão, de 06 (seis) meses a 2 (dois anos, e multa.
I – contra criança, adolescente ou idoso;
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código;
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma. § 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.
Art. 3º Fica revogado o art. 65 do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941.
O delito de perseguição, incluído pelo art. 147-A do Código Penal, tutela a liberdade do indivíduo, caracterizando-se, a priori, como delito de perigo, vez que se revela como delito de flanco para diversos outros delitos.
O ataque à liberdade individual com o objetivo de ameaçar alguém da prática de um mal injusto e grave tem o condão de perturbar sua paz, reduzindo sua faculdade de determinar-se de forma livre.
A conduta, conhecida por stalking, é a perseguição persistente, na qual o sujeito ativo pratica, reiteradamente, comportamentos ameaçadores sob o aspecto físico ou psicológico, contra alguém, ou ainda condutas invasivas e perturbadoras à esfera da liberdade ou privacidade da vítima.
Em tese, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo do delito de perseguição, vez que o tipo penal não exige qualquer qualidade especial do agente. Sendo o sujeito ativo funcionário público, a conduta ainda pode se amoldar aos tipos penais previstos na Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/19).
O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa que possua capacidade de compreensão e de decidir sobre seus próprios atos, excluindo-se, portanto, os menores de tenra idade, os loucos e etc. Registre-se que, nesses casos, o sujeito passivo poderá ser o responsável pelo menor ou pessoa sem capacidade de compreensão, vez que podem se revestir do meio pelo qual a conduta é praticada (perseguição a filho menor, por exemplo).
A arquitetura do crime de perseguição, previsto no art. 147-A do CP, é formada pelo verbo nuclear perseguir e pelos meios ameaçando, restringindo, invadindo ou perturbando; pela elementares objetiva alguém, integridade física ou psicológica, capacidade de locomoção; e pelas elementares normativas reiteradamente, por qualquer meio e sua esfera de liberdade ou privacidade.
Perseguir, no sentido do tipo penal, significa importunar, causar constrangimento. O tipo penal contempla três formas de caracterização do delito:
O crime de perseguição, em razão da elementar reiteradamente, é habitual, pois exige a reiteração dos atos por parte do sujeito ativo. Assim, não se consuma o delito com a mera prática de um ato, havendo a necessidade de habitualidade no comportamento a ponto de criar o temor ou perturbação da vítima.
Ainda no contexto da conduta, o crime pode ser praticado sob as modalidade dolo direto e eventual. Nesse particular, compreendemos que a habitualidade exigida pelo tipo penal não afasta a possibilidade do dolo eventual, pois o agente pode, mesmo não desejando diretamente, assumir o risco, com o seu comportamento, de dar causa ao resultado normativo, caracterizando a perseguição.
O tipo penal, para nós, não exige o especial fim de agir do agente, vez que suas condutas reiteradas, independentemente de sua perspectiva subjetiva, são capazes de causar o temor à vítima e constrangimento à sua liberdade e privacidade. O crime, igualmente, não admite a modalidade culposa.
O resultado, por se tratar de crime de perigo, é normativo. O resultado estará configurado com a efetiva caracterização da perseguição reiterada capaz de causar ameaça à integridade física ou psicológica, restrição à capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadir ou perturbar sua esfera de liberdade ou privacidade.
A solução do nexo de causalidade pela teoria da imputação objetiva não diverge da doutrina tradicional da teoria da equivalência das condições. O agente, ao perseguir a vítima de forma reiterada, ameaçando-lhe a integridade psicológica, cria um risco juridicamente desaprovado para os bens jurídicos liberdade e intimidade. Em tese, a solução pela teoria da imputação objetiva dar-se-á apenas pelo primeiro nível de imputação, posto que o resultado é normativo. Contudo, podemos afirmar que o risco criado materializa-se na violação da norma “não perseguirás”, sendo que o resultado produzido encontra-se dentro do alcance do tipo, que contempla, igualmente, sua garantia de vigência e validade.
Por fim, a estrutura do tipo penal completa-se com a tipicidade, expressamente consignada no art. 147-A do Código Penal.
O crime de perseguição consuma-se com a efetiva caracterização da perseguição reiterada capaz de causar ameaça à integridade física ou psicológica, restrição à capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadir ou perturbar sua esfera de liberdade ou privacidade da vítima.
Não se exige, portanto, a produção de resultado naturalístico. O alcance dos verbos-meio – ameaçar, restringir, invadir e perturbar – deve ser interpretado sob a luz do verbo nuclear perseguir. De fato, ainda que, por exemplo, a modalidade restringir possa induzir à ideia de efetiva restrição, na realidade a mens legis caminha na linha do dificultar e não da efetiva restrição, sob pena de caracterização do delito de sequestro ou cárcere privado.
Em linhas gerais, o tipo penal trilha o caminho do embaraço, do constrangimento, da importunação e perturbação, e não da efetiva realização de comportamentos que poderiam ser alcançados, autonomamente, por outros tipos penais, como a ameaça, constrangimento ilegal e cárcere privado.
A tentativa para nós não se revela admissível, pois o tipo penal exige a habitualidade comportamental e consequente reiteração de atos, não havendo possibilidade de fracionamento do iter criminis.
O §1º do art. 147-A prevê:
§1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:
I – contra criança, adolescente ou idoso;
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código;
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma.
O inciso I revela-se verdadeira norma penal em branco homogênea heterovitelina, pois os conceitos de crianças e adolescentes são extraídos do art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente[1] e o conceito de idoso do art. 1º da Lei 10.741/03[2].
De igual modo, o inciso II também exige o complemento normativo homogêneo/homovitelino do §2º-A do art. 121 do Código Penal no que tange ao conceito de razões da condição de sexo feminino, sendo, igualmente, norma remetida.
O inciso III, por sua vez, contempla a previsão da majorante de metade quando o crime for cometido mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma. De fato, o legislador puniu, de forma mais severa, o comportamento facilitado pelo risco maior imposto à vítima em razão da superioridade numérica de agentes ou emprego de armas.
Para contabilização do número de agentes podem ser contabilizados o menor inimputável ou o agente não identificado. No tocante ao emprego de arma, entendemos que a compreensão do termo “arma” deve englobar qualquer instrumento que possa ser concebido como hábil da ferir, concretamente, a integridade corporal da vítima. Assim, armas de fogo, facas e porretes, entre outros, caracterizam a elementar especializante. No que concerne à arma de brinquedo, não obstante ser hábil a constranger a vítima, entendemos que, por ser instrumento incapaz de aumentar o risco para a vítima, não se aplica a majorante.
O §2º do art. 147-A prevê que além das penas cominadas ao crime de perseguição, aplicam-se as penas correspondentes à violência. Logo, ocorrendo lesões corporais como decorrência do comportamento do agente, o legislador previu o concurso de crimes para fins de aplicação da reprimenda.
De fato, não obstante a violência não ser elementar do delito, optou a lei por aplicar a regra do cúmulo material entre a penas dos crimes, pois o delito de perseguição pode apresentar, no seu contexto, a violência. Assim, para efeitos jurídicos, aplica-se a regra do concurso material de crimes, cumulando-se materialmente as penas previstas para cada delito, registrando-se, contudo, que a caracterização do crime de perseguição pressupõe a habitualidade delitiva, isto é, só teremos o concurso material se houver, previamente, a reiteração dos atos de perseguição.
Segundo a regra do §3º do art. 147-A, a ação penal é pública condicionada à representação.
Vejamos um caso com solução pela teoria da imputação objetiva:
Fernando Abreu
@prof.fernandoabreu
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[1] Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
[2] Art. 1o É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.
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